A noite em que James Brown acalmou Boston

Posted by

James Brown

A história não é nem um pouco nova, mas vale a pena ser contada quantas vezes forem necessárias. É a prova de que o carisma e a presença de palco de um artista podem ser determinante até para resolver problemas políticos e sociais. Hoje, aparentemente, muito se subestima o poder de um líder – e, sim, quando o artista está num palco ele é um líder.

No início da noite de 4 de abril de 1968, Martin Luther King foi assassinado em Memphis, Tennessee. Quase que automaticamente, os bairros de maioria negra de todo os Estados Unidos explodiram em resposta à morte de seu maior líder. A revolta continuou no dia seguinte, na noite seguinte… tanto que o presidente Lyndon Johnson cancelou uma viagem que faria ao Havaí e declarou Estado de Emergência. O exército ficou de prontidão e os confrontos com a população foram intensos em Washington, D.C., Baltimore, Louisville, Kansas City e Chicago. Mas com uma cidade o exército não precisou se preocupar: Boston. Motivo: James Brown estava lá.

A show de 5 de abril de 1968 já estava marcado há alguns meses e quase foi cancelado na última hora. Inicialmente, as autoridades pensaram que o show fosse atrair a multidão e seria um estopim para mais violência. Depois, voltaram atrás e chegaram à conclusão de que o cancelamento seria pior. O plano foi de manter o show e ainda transmiti-lo pela TV, ao vivo, com a intenção de fazer com que as pessoas ficassem em casa. E o resultado foi exatamente esse: os 14 mil lugares do Boston Garden foram ocupados e, quem não foi até o local, acompanhou o show pela WBGH, estação pública local.

Mas claro que o show não foi normal. Não foi apenas mais uma noite na vida de James Brown. A começar pela quantidade de policiais que havia no palco. E pela comoção, visível, da plateia.

Em determinado momento, quase no fim do show, alguns jovens invadem o palco. Querem protestar, mostrar que estão revoltados. Querem ser ouvidos, vistos, qualquer coisa que diminuísse um pouco o sofrimento daquele dia. Alguns sobem apenas para cumprimentar Brown. E aí James Brown se mostrou um líder.

No instante em que a polícia avançava sobre os manifestantes, ele mandou parar tudo. Pediu para que a polícia se afastasse, saísse dali, e deu sua palavra: nada aconteceria naquela noite. Logo depois, se dirigiu ao público: “Eu pedi para a polícia se afastar porque eu acho que posso ter o respeito do meu próprio povo”. A música venceu, o show continuou.

O DVD

O show existe em DVD, o Live at the Boston Garden: 1968, que não tem edição brasileira. Nem se sabe exatamente como ele chegou ao formato digital, já que foi transmitido ao vivo no dia e ficou registrado em alguma fita cassete na emissora de Boston. O crítico Bruce Eder, do All Music, credita a ação a algum “pirata anônimo”.

A apresentação foi eleita como o melhor show da história de Boston pelo jornal local The Phoenix, ficando a frente do show que o Nirvana realizou na cidade um dia antes de lançar o disco Nevermind.

O show ganhou ainda um documentário, o The Night James Brown Saved Boston. Já vi no History Channel, legendado, mas ele está no YouTube, sem legendas. Ele traz ótimas imagens tanto do show quanto do pânico que tomou conta das ruas dos Estados Unidos e todo aquele clima tenso que pairava sobre o acontecimento. Tem também algumas declarações de James Brown sobre a noite. Aqui, a primeira parte, de oito:

Segunda parte: http://www.youtube.com/watch?v=J_je9eAoyio&NR=1&feature=endscreen; Terceira parte: http://www.youtube.com/watch?v=ag5JMlbennA; Quarta parte: http://www.youtube.com/watch?v=l-hyU9p6r9s; Quinta parte: http://www.youtube.com/watch?v=ylC0vdGz27g; Sexta parte: http://www.youtube.com/watch?v=DsHZakDPDvo; Sétima parte: http://www.youtube.com/watch?v=o0IdEB4Svto; Oitava e última parte: http://www.youtube.com/watch?v=G7JUzrkQZkQ.

E finalmente, claro, o show, na íntegra. No começo, o prefeito de Boston faz um pronunciamento para deixar claro que aquele show é um tributo a Martin Luther King: “James Brown está aqui para tornar o sonho de Luther King realidade em Boston”. A invasão do palco é quase no fim do show, a partir de 1h29m.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *